Mundo Celestrin Artigos de 18-6-13- Do New York Times para a Folha.txt

Artigos de 18-6-13- Do New York Times para a Folha


** ROGER COHEN
EUA recuam de valores fundamentais

Londres
Depois dos ataques de 11 de setembro de 2001, veio a Grande Desorientação.
Os Estados Unidos, vendo estilhaçada a sensação de ser um santuário, perderam o rumo. O Congresso deu um cheque em branco ao presidente para travar guerras aonde
ele quisesse. A imprensa quase não questionou a marcha para a guerra no Iraque, iniciada sob falsos pretextos. Guantánamo zombou do devido processo legal.
Ao mesmo tempo, como deixam claros os vazamentos sobre a Agência de Segurança Nacional fornecidos pelo dedo-duro Edward Snowden, a violação da privacidade dos americanos
e de pessoas do mundo todo foi disseminada em nome da segurança dos EUA. Rápidos avanços tecnológicos e o crescimento de vastos mananciais de dados -o "big data"-
facilitaram o processo. O Grande Irmão sabe agora, num grau que seria inimaginável há uma década, onde você está e o que você está pensando em fazer.
Snowden fez algo corajoso. Ele dá toda a impressão de ser lúcido e comedido e de ter pesado cuidadosamente cada ação sua. O governo Obama deveria demonstrar grande
moderação na sua resposta. O que é necessário não é perseguir o dedo-duro, mas refletir sobre suas revelações.
Antigamente, era fácil rir da ideia de que alguém poderia vasculhar o imenso volume de dados gerados pela comunicação digital. Como informaram meus colegas James
Risen e Eric Litchblau, o universo digital deve dobrar de tamanho a cada dois anos de agora até 2020. Mas toda essa informação já pode ser armazenada e filtrada.
A necessidade de supervisão e de controle genuínos é premente. É hora de tirar os EUA dos seus 12 anos de pé de guerra e restaurar as instituições de freios e contrapesos
que serviram ao país desde sua fundação.
Obama disse, no mês passado, antes das revelações de Snowden, que estava preocupado com as concessões dos EUA a respeito dos seus "valores básicos". Ele manifestou
algumas boas intenções e disse que a guerra do pós-11 de Setembro deve terminar.
Mas, entre as muitas questões levantadas por Snowden, há algumas que são fundamentais a respeito desse presidente.
Minha própria sensação acerca de Obama é que ele tem boas intenções liberais -acabar com a tortura, fechar a prisão da baía de Guantánamo, restaurar o devido processo
legal, interromper a violação das liberdades individuais, restringir a guerra com "drones" e limitar o inchaço dos poderes do Executivo- e que ele fala as coisas
corretas a respeito de todas essas questões.
No entanto, ainda que não seja um entusiasta, Obama se mostra mais do que disposto a manter os poderes acumulados na Casa Branca por seu antecessor, intensificando
a guerra com "drones", despachando mais forças para o Afeganistão, ampliando a vigilância sobre os telefonemas dos americanos, monitorando atividades nas redes sociais
e prolongando a vida de Guantánamo.
Em suma, há uma brutal dissonância entre as suas palavras -talvez até mesmo as suas convicções- e as suas ações. Por quê? Porque a última coisa à qual Obama pode
se dar ao luxo é de ser visto como um negro raivoso que estaria enfrentando as instituições militares e de segurança em nome dos seus ideais liberais? Porque o combate
ao terrorismo é tão intratável que exige concessões dolorosas? Ou porque, na verdade, o liberalismo de Obama não passa de um verniz, e ele é no fundo um pragmático
duro, um advogado sempre buscando o meio-termo e um homem em que muitos ideais foram projetados por seus apoiadores, mas que, na verdade, carrega pouca dessa bagagem?
Talvez todos esses fatores tenham contribuído, mas acho que o primeiro deles é predominante.
Obama precisou podar seu liberalismo e sua raiva para ser eleito, aí isso virou um hábito. Agora Snowden, um jovem americano inteligente, perturbado pela traição
dos "valores básicos" sobre os quais o presidente falou, o chamou às falas. Este é um momento definidor para a Presidência de Obama: abater o mensageiro seria sugerir
que o não liberalismo do governo foi mais do que um desvio tático e que o idealismo de Obama era uma ilusão coletiva.

**EUA afiam capacidade de filtrar dados
Por JAMES RISEN e ERIC LICHTBLAU

WASHINGTON - Ao buscar novas formas de combater e caçar terroristas, a comunidade de inteligência dos Estados Unidos inaugurou parcerias com o Vale do Silício para
expor os segredos do "big data" -todo o volume de registros telefônicos,
e-mails e outros dados que se acumulou à medida que as comunicações digitais explodiram na última década.
A revolução resultante na tecnologia dos softwares deu, pela primeira vez, aos espiões americanos a capacidade de monitorar as atividades e movimentos das pessoas
em praticamente qualquer lugar do mundo, sem necessariamente observá-las ou escutar suas conversas.
Veio à tona neste mês que a NSA (Agência de Segurança Nacional dos EUA) obteve secretamente os registros telefônicos de milhões de americanos e o acesso a e-mails,
vídeos e outros dados de estrangeiros em poder de nove empresas americanas da internet.
Isso oferece um raro vislumbre do crescente alcance da maior agência de espionagem dos EUA. O fato também alarmou o governo: em 8 de junho, Shawn Turner, porta-voz
do diretor de Inteligência Nacional, disse que "a NSA registrou um boletim de ocorrência" sobre os vazamentos.
Um documento da NSA, supostamente vazado ao jornal britânico "The Guardian" por um ex-prestador de serviços da agência chamado Edward Snowden, mostrou um "mapa global
de calor" que parecia representar o volume de dados colhido pela NSA. Ele mostrava que, em março de 2013, havia 97 bilhões de informações recolhidas de redes no
mundo todo. Cerca de 14% estavam no Irã, muita coisa era do Paquistão e cerca de 3% vinham de dentro dos EUA.
Com pouco debate público, o governo dos EUA tem despejado bilhões de dólares na agência ao longo da última década, construindo uma fortaleza de 93 mil m2 em Utah
aparentemente para armazenar indefinidamente enormes volumes de dados pessoais. A NSA criou estações de interceptação em todo o país, segundo ex-funcionários da
iniciativa privada e do setor de inteligência, e ajudou a montar um dos mais velozes computadores do mundo para decifrar os códigos que protegem as informações.
"Há cinco anos, eles ainda não tinham a capacidade de monitorar um volume significativo de tráfego na internet", disse Herbert Lin, especialista em ciência da computação
e telecomunicações no Conselho Nacional de Pesquisas. Agora, disse ele, parece que "eles estão se aproximando desse objetivo".
A capacidade da agência para garimpar dados sobre quem está ligando ou mandando e-mails torna menos importantes as escutas telefônicas, segundo especialistas. Mas
esse acesso aos dados desperta questões perturbadoras sobre a privacidade e as liberdades civis. A União Americana das Liberdades Civis abriu em 11 de junho uma
ação judicial contra o governo Obama, pedindo a um juiz de Nova York que interrompa a coleta de dados domésticos e expurgue os arquivos.
"As leis e políticas americanas veem o conteúdo das comunicações como o que deve ser preservado, mas isso hoje é retrógrado", disse Marc Rotenberg, diretor-executivo
do Centro de Informação da Privacidade Eletrônica, de Washington. "A informação associada às comunicações hoje é, com frequência, mais significativa do que as comunicações
em si. As pessoas garimpam de dados sabem disso."
A legislação americana restringe os grampos telefônicos e a bisbilhotagem do conteúdo das comunicações de cidadãos americanos, mas oferece pouquíssima proteção para
os dados digitais emitidos pelo telefone quando uma ligação é feita.
Graças aos smartphones, aos tablets, às redes sociais, aos e-mails e a outras comunicações digitais, o mundo cria 2,5 quintilhões de bytes de novos dados diariamente,
segundo a IBM. A empresa estima que 90% dos dados que hoje existem no mundo foram criados apenas nos últimos dois anos. De agora até 2020, o universo digital deverá
duplicar a cada dois anos, segundo a empresa International Data Corporation.
Ao mesmo tempo, houve um rápido avanço na capacidade de filtrar a informação.
Meros quatro dados acerca da localização e do momento de uma ligação por celular bastam, segundo estudo publicado na "Nature", para identificar o autor da chamada
em 95% das vezes.
"Podemos encontrar todos os tipos de correlações e padrões", disse um cientista de computação do governo que falou sob a condição de anonimato. "Tremendos avanços
vêm ocorrendo."
Quando o presidente George W. Bush iniciou secretamente o programa da NSA que realizava escutas telefônicas, em outubro de 2001, para observar telefonemas internacionais
e e-mails de cidadãos americanos sem autorização judicial, o programa veio acompanhado por operações de garimpagem de dados em grande escala.
Essas atividades secretas levaram, em março de 2004, a um confronto entre funcionários da Casa Branca de Bush e um grupo de altos funcionários do Departamento de
Justiça e do FBI.
Advogados do Departamento de Justiça que estavam dispostos a manter os grampos sem mandado judicial argumentavam que a garimpagem de dados motivava preocupações
constitucionais ainda maiores. Em 2003, após a revelação de que o Pentágono tinha um plano para criar uma operação de garimpagem de dados, protestos forçaram o governo
Bush a recuar.
Mas, desde então, as operações de garimpagem de dados por parte da comunidade de inteligência têm crescido enormemente, segundo especialistas.
"Cada vez mais, serviços como Google e Facebook se tornaram imensos repositórios centrais de informação", disse Dan Auerbach, analista da Fundação Fronteira Eletrônica.
"Isso criou uma pilha de dados que é um alvo incrivelmente atraente para agências legais e de inteligência."
As agências de espionagem, há muito tempo, estão entre os clientes que mais exigem avanços na informática e na coleta de dados -ainda mais nos últimos anos.
Em 2006, o governo Bush estabeleceu um programa para acelerar o desenvolvimento de tecnologias relativas à inteligência. Watson, da IBM, tecnologia de supercomputação
que derrotou campeões humanos do "Jeopardy!" [programa de perguntas a respostas] na televisão em 2011, é um ótimo exemplo do poder da inteligência artificial com
uso intensivo de dados. A informática no estilo Watson poderia observar padrões de comportamento suspeito na internet.
A NSA e a CIA (Agência Central de Inteligência) estão testando o Watson nos últimos dois anos, segundo um consultor que assessorou o governo e pediu para não ser
identificado por não estar autorizado a falar.
Especialistas do setor dizem que as agências legais e de inteligência também usam uma nova tecnologia, chamada trilaterização, que permite monitorar a localização
de um indivíduo. "É o Grande Irmão ao extremo", disse Alex Fielding, especialista em data centers.
Além de abrir o data center de Utah, o que supostamente está previsto para este ano, a NSA ampliou secretamente seu acesso a dados de comunicações dentro dos Estados
Unidos, segundo denunciantes. Nada do que foi revelado nos últimos dias sugere que os espiões da NSA tenham violado a lei americana.
Em 7 de junho, o presidente Barack Obama defendeu a coleta de dados pela agência. "Ninguém escutou o conteúdo do telefonema das pessoas", afirmou ele.
Rotenberg, referindo-se aos limites constitucionais a buscas e apreensões, disse que "é um pouco fantasioso achar que o governo pode apreender muita informação sem
implicar os interesses dos cidadãos americanos na Quarta Emenda".


**Ensaio - Michael Kimmelman
Turquia debate espaço público

Istambul
Em um dia normal, a praça Taksim é uma balbúrdia de ônibus e gente e um emaranhado de espaços abertos, ruas, lojas e buzinas de táxis. O primeiro-ministro da Turquia,
Recep Tayyip Erdogan, está determinado a limpá-la e transformá-la em uma zona para pedestres, com um novo shopping center, uma mesquita e túneis para que o tráfego
flua no subsolo.
A reação indignada a isso encheu a praça, em maio, com manifestantes barulhentos, irritados e determinados, embora o governo tenha começado a desocupar a área em
11 de junho.
Depois da praça Tahrir, no Egito, e do parque Zuccotti, em Nova York, a Taksim é o mais novo símbolo da força do espaço público. A praça se tornou uma arena para
visões de mundo conflitantes: a visão conservadora, impositiva e neo-otomana de um líder inflexível, que considera sua nação uma potência regional,
contra uma visão de baixo para cima, pluralista, desordenada, primariamente jovem e menos islâmica do país como uma democracia moderna. "A Taksim é onde todos expressam
livremente sua felicidade, sua tristeza e suas visões políticas e sociais", disse Esin, 41, que observava o protesto na praça.
Então o espaço público, mesmo um trecho modesto e caótico como a Taksim, volta a se revelar como sendo fundamentalmente mais poderoso do que as redes sociais, que
produzem comunidades virtuais. As revoluções acontecem na carne.
Na Taksim, estranhos se descobriram mutuamente com suas preocupações comuns e sua voz coletiva. A força dos corpos se juntando produziu um momento democrático e
criou uma perigosa crise política para a liderança.
"Nós nos encontramos", disse o arquiteto Omer Kapinak, 41, referindo-se à diversidade reunida no parque Gezi, na extremidade norte da Taksim, onde a multidão acampou
depois que o governo de Erdogan ordenou que escavadeiras abrissem espaço para o shopping.
Há um problema. O primeiro-ministro se tornou o mais forte líder da Turquia desde que Mustafa Kemal Ataturk fundou a república -mas continua não sendo um grande
planejador urbano. Ele assumiu o manto de urbanista-chefe, intrometendo-se em detalhes relativos a mesquitas gigantes, planejando uma enorme ponte e um canal e concebendo
condomínios fechados. O objetivo é uma esfera pública roteirizada. A Taksim, animado coração da Istambul moderna, tornou-se a obsessão de Erdogan e talvez seu calcanhar
de Aquiles.
É natural. O próprio tecido urbano da Taksim -fluido, irregular e aberto- reflete a identidade histórica da área como coração da Turquia moderna e multicultural.
Foi lá que imigrantes europeus pobres se instalaram no século 19. Essa foi uma área de vida noturna degradada até a década de 1980, um refúgio para gays e lésbicas,
uma região de boates. Agora, é símbolo de modernidade.
A ideia do primeiro-ministro para uma grande praça para pedestres, com o tráfego enterrado, visa suavizar a praça e reconstruí-la como um parque temático neo-otomano.
Erdogan ultimamente recuou da ideia de instalar um shopping na réplica de quartel otomano a ser construída onde hoje está o Gezi. Mas ele pretende demolir um bairro
pobre perto dali, chamado Tarlabasi, para construir condomínios de luxo.
Outro dos seus projetos prevê um higiênico "desfilódromo" na periferia sul da cidade, destinado a concentrações populares, como que para colocar os protestos sob
quarentena: a anti-Taksim.
A verdadeira Taksim é uma desordenada área pública no meio da cidade.
Erdogan já demoliu um adorado cinema e uma velha loja que vendia pudim de chocolate na avenida Istiklal (Independência), principal rua e espinha dorsal do bairro
no acesso à Taksim. Por isso, muitos turcos não se surpreenderam com o fato de o parque Gezi ser a gota d'água.
"O espaço público equivale a uma identidade urbana e cosmopolita", disse Gokhan Karakus, arquiteto. "É exatamente disso que o primeiro-ministro não gosta. O povo
turco que ocupou o parque Gezi no protesto sente que ele realmente lhe pertence."
Perto da estátua de Ataturk, no meio da praça Taksim, agora adornada por bandeiras e cartazes dos manifestantes, estava uma estudante de fotografia que se identificou
como Kader, 24, do norte da Turquia. "Vim dar um tempo aqui porque tem todo tipo de gente e é divertido", disse.
Enquanto ela falava, um casal turco de braços dados, a mulher com lenço na cabeça, passava por lá. "O primeiro-ministro está tratando o lugar como sua propriedade
privada", fez questão de deixar claro Kader.
O plano de Erdogan para retirar ônibus e táxis e instalar uma vasta zona única de pedestres na Taksim, privada assim da sua energia áspera e imprevisível e transformada
em uma polida área comercial, irá acabar com a vitalidade pedestre da praça, em vez de torná-la mais atraente para os pedestres.
No parque Gezi, um letreiro cita antigos versos do poeta turco Nazim Hikmet:

"Sou uma nogueira no parque Gulhane
Nem você está ciente disso nem a polícia"

O arquiteto Kapinak me disse que a ameaça da intervenção de Erdogan na Taksim, "pela primeira vez, ajudou a derrubar as paredes do medo em se opor a um Estado autocrático".
No entanto, as tensões crescem rapidamente.
O conflito pelo espaço público sempre tem a ver com controle versus liberdade, segregação versus dignidade. O que está em jogo é mais do que uma praça. É a alma
de uma nação.


** TOM BRADY
Smartphones podem estar nos tornando mais "burros"

Muito tempo atrás, alguns escritores decidiam morar em lugares afastados para bloquear o mundo exterior e se concentrar na página em branco. Hoje, está ficando cada
vez mais difícil manter o mundo tecnológico à distância. Alguns desses retiros para artistas permitiram o acesso sem fio aos estúdios, enquanto outros, como Yaddo
e MacDowell, limitam a capacidade de acesso à internet em suas bibliotecas.
"As pessoas às vezes se surpreendem com sua própria reação quando ficam off-line", disse ao "Times" David Macy, diretor e residente da colônia artística MacDowell.
"Eu acho que há até um nome médico para isso -ou talvez seja o nome do [jornal satírico] 'The Onion'-: 'ansiedade provocada por não estar em um hot spot sem fio'."
Alguns escritores instalaram programas de software como Freedom e SelfControl para tentar limitar a navegação na internet. O romancista americano Jonathan Franzen
retirou o cartão sem fio de seu computador, colocou o cabo de rede no lugar e depois cortou o cabo, transformando o computador em uma máquina de escrever livre de
internet, relatou o "Times".
O objetivo de minimizar as distrações é mais que nobre. As interrupções nos tornam menos inteligentes, segundo pesquisa do Laboratório de Integração Humana-Computador
da Universidade Carnegie Mellon em Pittsburgh, na Pensilvânia.
Os pesquisadores de lá decidiram medir o poder cerebral perdido quando alguém é interrompido por um telefonema ou por um e-mail, relataram no "Times" os autores
Bob Sullivan e Hugh Thompson. Quando os sujeitos eram informados de que deviam esperar uma distração e eram interrompidos durante um teste, se saíam muito pior que
os sujeitos que eram deixados à vontade. O grupo distraído/interrompido respondeu corretamente em 20% menos ocasiões que o grupo não interrompido.
"Existem evidências de que não somos tão viciados em novas mensagens de texto", escreveram. "Na verdade, elas também nos roubam energia cerebral."
O problema de monitorar um telefone celular e caminhar sem tropeçar nas coisas é algo que o Google esperava solucionar ao fazer o Glass. Outras empresas também estão
facilitando o uso do telefone junto com outras atividades, relataram no "Times" os psicólogos Daniel J. Simons e Christopher F. Chabris. Em abril, a Chevrolet anunciou
sua "integração sem olhos e sem mãos" com a interface de comando de voz Siri do iPhone.
Essas tecnologias parecem soluções ideais, permitindo que você interaja com seu smartphone enquanto continua alerta para o entorno. Mas o cérebro não funciona assim.
"O problema é que olhar não é a mesma coisa que ver", escreveram Simons e Chabris, "e as pessoas fazem suposições erradas sobre o que vai chamar sua atenção."
Experimentos mostraram que as pessoas deixam de notar coisas tão óbvias quanto alguém vestido de gorila quando sua atenção é distraída. "Pesquisadores usando dispositivos
de rastreamento de olhos descobriram que as pessoas podem não ver a roupa de gorila mesmo quando olham diretamente para ela", disseram Simon e Chabris. "Esse fenômeno
de 'cegueira desatencional' mostra que o que vemos depende não apenas de para onde olhamos, mas também de como focalizamos a atenção."
Poucos autores abandonariam a capacidade de pesquisa que a internet oferece. A era da computação "usável" já chegou, mas a nova tecnologia está evoluindo mais depressa
que nossa capacidade de administrá-la.
"O Google Glass pode permitir que os usuários façam coisas incríveis", escreveram Simon e Chabris, "mas não elimina os limites da capacidade humana de prestar atenção."


** Emirados sufocam dissidência islâmica
Por BEN HUBBARD

RAS AL-KHAYMAH, Emirados Árabes Unidos - As monarquias árabes do Golfo Pérsico usam petrodólares há anos para aplacar os chamados por mudanças. Agora, estão voltando
a recorrer à ameaça de prisão.
Em fevereiro, no Qatar, um poeta foi sentenciado a 15 anos de prisão por um poema subversivo. Já a Arábia Saudita reprimiu protestos de sua minoria xiita, perseguindo
ativistas. Mas o caso mais abrangente é o dos Emirados Árabes Unidos, uma federação de sete emirados dinásticos impelidos à prosperidade graças à enorme riqueza
petrolífera e à adoção de políticas favoráveis às empresas.
O governo dos Emirados agiu agressivamente para sufocar o Islah, grupo islâmico que, no passado, operava um complexo social na entrada de Ras al-Khaimah.
Toda a direção da organização foi substituída por decreto governamental, dezenas de seus membros foram levados a julgamento e até mesmo seu nome foi mudado.
Noventa e quatro membros do Islah foram acusados criminalmente de conspirar com outro grupo islâmico, a Irmandade Muçulmana, para depor o governo.
Entre os réus, que podem ser sentenciados a 15 anos de prisão, há juristas destacados, acadêmicos e até mesmo parentes de uma das famílias reais do país.
Em janeiro, o procurador-geral declarou que os detidos "lançaram, fundaram e administraram uma organização que se opunha aos princípios básicos do sistema de governança
dos EAU e tinha por objetivo tomar o poder".
Khalid Alroken, cujo irmão, um advogado de destaque, é um dos acusados, negou que a organização tenha objetivos políticos. "É uma organização social que trabalha
com o povo visando a preservação dos Emirados como país muçulmano de característica árabe", afirmou. "As autoridades interpretaram nossas atividades como o primeiro
elo de uma cadeia que visaria derrubar o governo e enfraquecer o Estado."
A repressão começou em 2011, após o início das revoltas árabes, embora não tenham ocorrido protestos nos EAU. Mais de 130 ativistas, incluindo acadêmicos e algumas
dezenas de membros do Islah, firmaram uma petição pedindo que os membros do Parlamento fossem eleitos livremente e recebessem poderes legislativos plenos.
Um mês depois, cinco ativistas e críticos do governo foram detidos e levados a julgamento, acusados de insultar os dirigentes do país. Todos foram sentenciados à
prisão, mas perdoados no dia seguinte.
O Islah operava legalmente no país desde 1974. Em 1994, sua sede em Dubai foi fechada, levando o grupo a se transferir para Ras al-Khaimah. A partir de 2011, enquanto
a Primavera Árabe explodia em outros países, sete membros do Islah foram privados de sua cidadania, enquanto dezenas de outros eram presos. Em 2012, o sultão Bin
Kayed al-Qassemi, presidente do Islah e primo do governante de Ras al-Khaimah, foi um dos detidos.
Os Emirados parecem ser palco improvável de um revival islâmico. Seus líderes aproveitaram sua riqueza, abertura econômica e mão de obra estrangeira para converter
o país em centro de atividade internacional. Mas isso não foi seguido por abertura política. Os partidos políticos são proibidos, e a maioria dos cidadãos não pode
votar.
"Não somos um país democrático, mas somos progressistas em relação a várias questões -no tocante às mulheres e ao que eu chamaria de tolerância", comentou Anwar
Gargash, ministro de Estado das Relações Exteriores. De acordo com ele, o governo prioriza a prosperidade, não o desenvolvimento econômico.
Muitos árabes concordam, temendo que grupos como o Islah coloquem em risco a estabilidade que tornou seu país de 5,5 milhões de habitantes rico, seguro e pacífico.
"Este país funciona porque é apolítico", opinou o escritor Sooud al-Qassemi. "É uma zona livre de islamismo político. "
Mas muitos perguntam o que significa ser cidadão dos Emirados Árabes Unidos. Uma visão pode ser testemunhada em Dubai, a maior cidade do país, onde os habitantes
locais são poucos, o consumo de álcool é generalizado e mulheres de minissaia flertam com homens em público. A visão oposta, defendida pelo Islah, prevalece nos
emirados menos ricos do norte do país, onde ainda vigoram códigos sociais tradicionais.
Talvez seja paradoxal que a incerteza, o caos e a guerra (em alguns casos) que se seguiram à Primavera Árabe tenham reforçado o apoio ao governo.
"Temo que uma transição democrática hoje, num país como os EAU, nos submetesse ao conservadorismo reacionário", comentou o analista político Mishaal Al Gergawi.
"Olho para o que está acontecendo no Egito e em outros lugares e me pergunto se precisamos desse tipo de transição."


** China colhe benefícios do petróleo no Iraque
Por TIM ARANGO e CLIFFORD KRAUSS

BAGDÁ - Desde a invasão liderada pelos Estados Unidos em 2003, o Iraque se tornou um dos maiores produtores de petróleo do mundo. Hoje, a China é seu maior cliente.
A China compra quase a metade do petróleo produzido no Iraque, cerca de 1,5 milhão de barris por dia, e está querendo uma parcela ainda maior, com uma proposta de
participação na Exxon Mobil em um dos maiores campos de petróleo do Iraque.
"Os chineses são os maiores beneficiários do boom do petróleo pós-Saddam", disse Denise Natali, especialista em Oriente Médio na Universidade de Defesa Nacional
em Washington.
As companhias estatais chinesas levaram centenas de trabalhadores para o Iraque e despejaram no país mais de US$ 2 bilhões por ano. Elas se mostraram dispostas a
seguir as regras do novo governo iraquiano e aceitar lucros mais baixos para conseguir contratos.
"Nós perdemos", disse Michael Makovsky, ex-autoridade do Departamento de Defesa dos EUA no governo Bush que trabalhou na política do petróleo no Iraque. "Os chineses
não tiveram nada a ver com a guerra, mas, do ponto de vista econômico, eles estão lucrando com ela e nossa Quinta Frota e a força aérea ajudam a garantir seu abastecimento."
No deserto perto da fronteira do Iraque, a China construiu recentemente um aeroporto para levar trabalhadores para os campos de petróleo no sul do país. Há planos
de começar em breve voos diretos de Pequim e Xangai para Bagdá. Os executivos chineses impressionam seus anfitriões falando árabe com sotaque iraquiano.
A China aceita as condições do Iraque, o que gera lucros mínimos, porque está mais interessada em energia para alimentar sua economia do que em lucros para enriquecer
suas gigantes do petróleo.
As empresas chinesas não têm de responder a acionistas, pagar dividendos ou mesmo gerar lucros. Elas são ferramentas da política de Pequim para garantir o suprimento
de energia à sua enorme população.
No final do ano passado, a Corporação Nacional de Petróleo da China fez uma proposta de participação de 60% no campo de petróleo de West Qurna I. A Exxon Mobil resistiu
à pressão para vender, e, em março, a companhia chinesa disse que estaria interessada em formar uma parceria com a americana no campo de petróleo.
A produção iraquiana aumentada, grande parte da qual é bombeada por trabalhadores chineses, protegeu a economia mundial de uma alta nos preços do petróleo resultante
das sanções ocidentais às exportações do produto pelo Irã.
O interesse da China pelo Iraque também poderá ajudar a estabilizar o país, que enfrenta um grave conflito sectário.
"Do ponto de vista geopolítico, isso desenvolve laços estreitos entre a China e o Iraque, embora a China não se envolva na política", disse David Goldwyn, coordenador
do Departamento de Estado para assuntos internacionais de energia no primeiro governo Obama. "Agora que eles estão lá, têm interesse em garantir a continuidade do
regime que facilita seu investimento."
A China tornou-se recentemente o maior importador mundial de petróleo. Ela está investindo em campos de petróleo e gás em todo o mundo -US$ 12 bilhões em 2011, segundo
o Departamento de Energia dos EUA.
O Iraque estima que seus campos, gasodutos e refinarias precisam de US$ 30 bilhões em investimentos anuais para que o país se torne uma das maiores potências energéticas
das próximas décadas. Mas empresas estrangeiras nem sempre são entusiásticas sobre as condições nacionalistas desfavoráveis do Iraque ou a instável situação de segurança
que pode colocar funcionários em perigo. Algumas, como a Statoil da Noruega, deixaram o país ou reduziram suas operações.
Os chineses, frequentemente como sócios de companhias europeias como BP e Turkish Petroleum, ocuparam o vazio.
"Eles oferecem muito capital e disposição para entrar rapidamente e com grande apetite por risco", disse Badhr Jafar, presidente da Crescent Petroleum, companhia
independente sediada nos Emirados Árabes Unidos.


** Terapia em grupo ajuda vítimas de estupro no Congo
Por DENISE GRADY

Um tipo de terapia em grupo criado para vítimas de traumas está sendo útil para sobreviventes da violência sexual na República Democrática do Congo (antigo Zaire),
possibilitando às mulheres superar a vergonha, os pesadelos e as recordações assustadoras que as tinham deixado incapazes de trabalhar ou de cuidar delas mesmas
e de suas famílias.
Pesquisadores levaram a chamada terapia de processamento cognitivo ao Congo, país que passou por duas décadas de guerra civil e que a ONU já descreveu como a capital
mundial do estupro.
O "New England Journal of Medicine" divulgou no dia 5 de junho um estudo sobre uma terapia que visa curar as cicatrizes mentais e emocionais de mulheres em uma parte
da África onde a violação se tornou uma arma de guerra.
Centenas de milhares de mulheres, desde criancinhas de colo até avós -segundo estudos, o número de vítimas pode chegar a 2 milhões de mulheres- foram estupradas
por combatentes rebeldes ou por soldados do governo. Os ataques incluíram estupros coletivos e a penetração com armas de fogo, facas e outros objetos, dilacerando
os intestinos e órgãos reprodutivos das mulheres.
O estudo abrangeu mulheres de 15 vilarejos rurais do leste do país, onde rebeldes lançam ataques com frequência. Cerca de 40% das mulheres na região já foram vítimas
de violência sexual, segundo pesquisadores da Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, da Universidade de Washington, em Seattle, e da organização International
Rescue Committee.
A terapia consiste em ensinar as pessoas a repensar sentimentos e ideias que podem continuar presentes depois de sofrerem um ataque. As mulheres que são estupradas,
por exemplo, com frequência se culpam pelo que aconteceu. Deixaram uma janela aberta. Saíram de casa sozinhas. Usaram roupas que provocaram a agressão. A terapia
as incentiva a questionar essas ideias.
Sete vilarejos, com 157 mulheres, foram selecionados para fazer parte da terapia em grupo. Já 248 mulheres de outros oito povoados receberam apoio individual.
A terapia em grupo consistiu em uma sessão individual com psicólogo e 11 sessões semanais de duas horas com o grupo. Os sintomas das mulheres foram avaliados e classificados
três vezes: antes do programa de tratamento, ao término dele e seis meses mais tarde.
Os pesquisadores constataram que a melhora proporcionada pela terapia em grupo foi marcante. Seis meses depois, apenas 9% das mulheres que tinham feito terapia em
grupo continuavam a apresentar ansiedade, depressão ou transtorno de estresse pós-traumático. A título de comparação, 42% das mulheres que tinham tido apoio individual
continuavam a apresentar os problemas.
A assistente social clínica Janny Jinor, que ajudou a supervisionar o estudo, contou que uma mulher compareceu à terapia emgrupo sem ter tomado banho, com os cabelos
desgrenhados e as roupas sujas. Tinha pouco mais de 50 anos e fora violentada alguns anos antes. Seu marido a rejeitara, e a família dele também a evitava.
Depois de algumas sessões da terapia, porém, ela voltou a cuidar da aparência e a usar roupas limpas. Agradeceu à psicóloga por ajudá-la a compreender que era uma
pessoa importante. "Ela começou a brilhar", contou Jinor, "e seus familiares passaram a enxergar nela mais que uma mulher culpada por ter sido estuprada."


**Crescimento de algas alimenta edifício
Por DAVID WALLIS

Um novo prédio em Hamburgo, na Alemanha, parece com uma estrutura moderna e tem uma das mais recentes tecnologias de construção sustentável -uma fazenda de algas
vertical.
Os criadores do edifício Bio Intelligent Quotient (BIQ), que custou US$ 6,58 milhões e usa exclusivamente energias renováveis, prometem que esse pioneiro sistema
energético irá colher algas de rápido crescimento para gerar biocombustíveis, produzir calefação, fazer sombra no prédio, atenuar o ruído da rua e entrar para a
história.
Sobre as laterais do edifício, estão montados 129 biorreatores, painéis de vidro plano sobre persianas externas que servem como ambiente para o crescimento das algas.
O sistema foi construído por um consórcio que incluiu a empresa de arquitetura Colt Group.
Em 2009, o consórcio venceu uma competição que pedia aos participantes para usar materiais inteligentes, definidos como "sistemas e produtos que se comportam dinamicamente,
ao contrário dos materiais convencionais de construção, que são estáticos".
As algas são alimentadas com nutrientes líquidos e com dióxido de carbono para estimular o crescimento no sistema, que se tornou operacional em abril. Ar pressurizado
é injetado nos painéis para estimular ainda mais o crescimento e impedir que micro-organismos se instalem e provoquem apodrecimento, disse Jan Wurm, um dos projetistas.
Ele observa que escovas nos painéis mantêm os vidros limpos automaticamente. Os painéis funcionam também como coletores térmicos solares, transformando a luz do
sol em energia utilizável.
Segundo Wurm, "a parte da luz que não é absorvida pelas algas para a fotossíntese é convertida em calor", o qual pode ser usado imediatamente para aquecer a água
ou armazenado no subsolo.
Periodicamente, as algas serão colhidas e armazenadas em tanques no edifício. Uma empresa local de energia irá então comprar a colheita e transportar a biomassa
até uma usina de calefação e energia nos arredores, onde ela passará por uma fermentação. O processo produz gás metano para a geração de eletricidade.
"A energia gerada seria neutra de carbono", disse Wurm.
Os projetistas da casa BIQ não sacrificaram a forma por causa da função. A cor das algas, combinada com o balé de bolhas da ascensão do ar pressurizado, lembra uma
lâmpada de lava, segundo Wurm.
Ainda está sendo debatido se o prédio com biorreatores de algas é o começo de algo grande ou apenas uma experiência isolada.
Wurm admite que a nascente tecnologia custa mais do que os sistemas solares ou combustíveis convencionais. "Em termos de custos de investimentos, não se pode compará-lo
a sistemas estabelecidos e produzidos em massa que estão no mercado", afirmou.
Jonathan Wimpenny, do Real Instituto de Arquitetos Britânicos nos EUA, questiona se muitos bancos e incorporadores imobiliários irão investir em biorreatores de
algas. "Dificilmente poderei considerar isso como um divisor de águas na prática construtiva cotidiana", disse Wimpenny.
Mas para David Bayless, da Universidade de Ohio, o prédio de Hamburgo é importante. "As pessoas ficam cautelosas com as algas porque é uma tecnologia relativamente
desconhecida."
O preço é um obstáculo em potencial. Scott Walzak, projetista do escritório global de arquitetura HOK, estima que o custo do quilowatt-hora produzido por biorreatores
de algas seria equivalente a sete vezes o preço da energia solar e 14 vezes o do petróleo bruto.
Anica Landreneau, líder de consultoria na HOK, concebeu um sistema para aproveitar os gases de escapamento dos carros na autoestrada Santa Ana, na Califórnia, como
fonte de carbono para alimentar as algas. "Elas prosperam com uma dieta de porcarias", disse Landreneau.
A Grow Energy, start-up de San Diego, na Califórnia, está apostando exatamente nisso para produtos que trilham caminhos diferentes a fim de gerar energia a partir
de algas. A empresa, criada há um ano, planeja produzir dois diferentes biorreatores de algas.
No ano que vem, a Grow Energy pretende aceitar pré-encomendas do seu sistema Verde, que cultiva as algas, as seca automaticamente e as queima num gerador de combustão
no próprio telhado para produzir eletricidade. O sistema Verde custará cerca de US$ 12 mil e produzirá em torno de 35% da eletricidade usada por um lar americano
médio.
O arquiteto Tom Wiscombe está animado com o prédio de Hamburgo. "Na história da arquitetura, tentar manter organismos, fungos e bolor constantemente fora de um prédio
sempre foi crucial", disse ele. "Agora, estamos tentando trazer tudo isso de volta."


** Dupla cria avião com energia solar que pode viajar à noite
Por DIANE CARDWELL

MOUNTAIN VIEW, Califórnia - Quando Bertrand Piccard era menino, na Suíça, discussões inebriantes sobre o potencial ilimitado da atividade humana eram corriqueiras.
Seu avô, um físico que foi amigo de Albert Einstein e Marie Curie, havia inventado uma cápsula especial para que ele e um parceiro pudessem ser os primeiros a atingir
a estratosfera em um balão. Seu pai, engenheiro, ajudou a projetar o submarino que permitiu que ele e um oficial americano da Marinha se tornassem os primeiros a
mergulhar até o local mais profundo da crosta terrestre.
"Todas as coisas mais incríveis pareciam ser normais", disse Piccard, psiquiatra com formação em hipnose, ao se preparar para a sua próxima expedição, aqui no Centro
de Pesquisa Ames, da Nasa, em Moffett Field.
Ele chegou a participar da equipe que foi a primeira a dar a volta ao mundo em um balão sem paradas. Mas quando a falta de propano quase acabou com a sua viagem
recordista, em 1999, ele começou a sonhar com uma maneira de voar noite e dia sem combustível, uma ideia que resultou num levíssimo avião movido a energia solar,
que decolou em 3 de maio para uma viagem atravessando os Estados Unidos.
O Solar Impulse não é o primeiro avião a voar com energia solar. Sua principal distinção é a capacidade de viajar à noite.
Pode levar décadas, pelo menos, até que viajantes comuns embarquem em aviões elétricos solares, mas a tecnologia já está sendo cogitada para "drones" (aviões teleguiados),
que correm o risco de sofrer danos quando pousam para reabastecer.
Algumas das tecnologias desenvolvidas para o Solar Impulse -que tem envergadura comparável à de um Boeing 747, mas o peso de um carro médio- estão destinadas ao
uso comercial, como é o caso das baterias usadas para armazenar a energia solar e da espuma que as isola.
A cabine do Solar Impulse acomoda uma só pessoa, então Piccard está se revezando nos trechos da viagem com seu parceiro, André Borschberg, voando a cerca de 73 km/h,
durante 18 a 20 horas por etapa.
A aeronave poderia teoricamente voar de forma contínua, mas os pilotos não conseguem. A sensibilidade do avião a turbulências exige atenção.
A dupla já fez escalas em Phoenix, Dallas e St. Louis e planeja uma parada em Washington antes do pouso final no Aeroporto Kennedy, em Nova York, mais para o final
de junho.
A viagem é precursora de uma jornada ao redor do mundo, planejada para 2015 e para a qual a equipe está construindo um segundo avião, acrescentando ajustes como
um piloto automático e um assento reclinável, a fim de ajudar os pilotos a voarem durante até cinco dias seguidos.
Os dois se conheceram depois que Piccard apresentou sua ideia de voo sem combustível ao Instituto Suíço de Tecnologia, que encarregou Borschberg de estudar o projeto.
Ele acabou supervisionando a concepção e a fabricação do avião, incluindo suas quase 12 mil células solares. Piccard se dedicou a arrecadar US$ 140 milhões em financiamentos
e patrocínios para sustentar a iniciativa.
Construído com um chassi de fibra de carbono, painéis solares de silício microcristalino e uma cobertura de carbono prateado, o avião é suficientemente robusto para
alcançar cerca de 9.100 metros de altura, mas tão frágil que daria para atravessá-lo com um dedo. "Tudo é tão eficiente que podemos voar apenas com o sol que coletamos
no avião", disse Borschberg.
Piccard disse que sua experiência com o balonismo lhe ensinou "jeitos diferentes de pensar, jeitos diferentes de reagir e jeitos diferentes de entender as situações".
"Na vida", afirmou, "você precisa abrir mão das suas certezas, das suas suposições comuns e, às vezes, das suas convicções para ser mais flexível e se adaptar ao
desconhecido".

** EUA testam torre eólica para alto-mar
Por MATTHEW L. WALD

Uma das razões para os ventos de alto-mar não terem engrenado como fonte energética nos Estados Unidos é o custo elevado da construção de uma torre na água. No entanto,
pesquisadores da Universidade do Maine tentaram recentemente outra abordagem, lançando uma máquina eólica flutuante. É a primeira instalação eólica em alto-mar em
águas americanas, segundo o Departamento de Energia.
A torre, lançada em Brewer, no Maine, assenta-se sobre três tubos ocos de concreto e ficará ancorada no golfo do Maine. Ela tem meros 20 quilowatts de capacidade,
volume de energia que poderia ser absorvido por um punhado de casas num dia quente de verão. Porém, tem um oitavo das dimensões daquela que os pesquisadores esperam
acionar dentro de alguns anos, um gigantesco modelo de 6 megawatts, em que cada lâmina tem comprimento equivalente à envergadura de um Boeing 747.
Por causa da sua localização, ela terá duas grandes vantagens sobre as máquinas em terra, segundo Habib Dagher, professor de engenharia civil na universidade.
As máquinas eólicas em terra geram a maior parte da sua energia à noite, ao passo que essa, segundo ele, irá apanhar as brisas fortes e previsíveis que surgem em
todas as tardes ensolaradas de verão, quando o sol aquece mais a terra do que o mar, criando uma brisa na direção da terra.
Ao longo de um ano, as máquinas em terra no leste dos Estados Unidos produzem apenas um terço da eletricidade que resultaria se elas funcionassem a plena capacidade
em todas as horas do ano. Já a instalação flutuante irá produzir de 40% a 50%, porque os ventos em alto-mar são mais fortes.
A engenharia, no entanto, é complicada: a ponta da torre, por exemplo, oscila junto com as ondas, mas a plataforma foi projetada para balançar em um ritmo mais lento
do que as ondas, a fim de reduzir seu impacto.
O projeto é um dos sete patrocinados pelo Departamento de Energia sob um programa de US$ 168 milhões. Três são flutuantes, quatro são fixas e essa é a primeira a
ser colocada em uso, segundo Jose Zayas, diretor do setor de Tecnologias de Energia Eólica e Hídrica do Departamento.
O projeto é pequeno, mas "é importante reconhecer que está numa escala relevante", afirmou. "Ele de fato representa o comportamento e a dinâmica de uma máquina grande."
Entre as questões está a da durabilidade. Dagher disse que o concreto não irá corroer e deve durar 60 anos.
"A beleza da tecnologia flutuante é que ela não liga para a profundidade da água", afirmou. A água é rasa na maior parte da Costa Leste, mas não no Maine e não em
grande parte da costa da Califórnia.

** Noruega importa lixo para produzir energia
Por JOHN TAGLIABUE

OSLO - Esta é uma cidade que importa lixo. Parte vem da Inglaterra, parte vem da Irlanda e parte vem da vizinha Suécia. Ela inclusive tem planos para o mercado americano.
"Eu gostaria de receber alguma coisa dos Estados Unidos", disse Pal Mikkelsen em seu escritório, numa enorme usina na periferia da cidade, onde o lixo é transformado
em calor e em eletricidade. "O transporte marítimo é barato."
Oslo, onde metade da cidade e a maioria das escolas são aquecidas pela queima do lixo -lixo doméstico, resíduos industriais e até resíduos tóxicos e perigosos de
hospitais e apreensões de drogas-, tem um problema: o lixo para queimar se esgotou.
O problema não é exclusivo de Oslo. Em toda a Europa setentrional, onde a prática de queimar lixo para gerar calor e eletricidade disparou nas últimas décadas, a
demanda por lixo é muito superior à oferta.
A meticulosa população do norte europeu produz apenas cerca de 136 milhões de toneladas de resíduos por ano, muito pouco para abastecer usinas incineradoras capazes
de consumir mais de 635 milhões de toneladas.
"Mas os suecos continuam a construir [mais usinas], assim como a Áustria e a Alemanha", disse Mikkelsen, 50, engenheiro mecânico que há um ano é o diretor-gerente
da agência municipal encarregada da transformação de resíduos em energia.
De navio e de caminhão, incontáveis toneladas de lixo viajam de regiões onde há excesso de resíduos para outras que têm capacidade para queimá-las e transformá-las
em energia.
A maioria das pessoas no país aprova a ideia. Os ingleses também gostam.
A empresa de Yorkshire que lida com a coleta de lixo no norte da Inglaterra atualmente embarca até 907 toneladas de lixo por mês para os países do norte da Europa,
incluindo a Noruega, de acordo com Donna Cox, assessora de imprensa da prefeitura de Leeds. Um imposto britânico sobre os aterros sanitários faz com que seja mais
barato enviar o lixo para lugares como Oslo.
Para alguns, pode parecer bizarro que Oslo recorra à importação de lixo para produzir energia. A Noruega está entre os dez maiores exportadores mundiais de petróleo
e gás e tem abundantes reservas de carvão e uma rede de mais de 1.100 usinas hidrelétricas em suas montanhas, ricas em água.
Mikkelsen, no entanto,disse que a queima do lixo é "um jogo de energia renovável para reduzir o uso de combustíveis fósseis".
Já Lars Haltbrekken, presidente da mais antiga entidade ambientalista da Noruega, afirmou que, do ponto de vista ambiental, a tendência de transformar resíduos em
energia constitui um grande problema, por gerar pressão pela produção de mais lixo.
Numa hierarquia de objetivos ambientais, disse Haltbrekken, a redução da produção de resíduos deveria estar em primeiro lugar, ao passo que a geração de energia
a partir do lixo deveria estar no final. "O problema é que a nossa prioridade mais baixa conflita com a mais alta", disse ele.
Em Oslo, as famílias separam seu lixo, colocando os restos de comida em sacos plásticos verdes, os plásticos em sacos azuis e os vidros em outro lugar. Os sacos
são distribuídos gratuitamente em mercearias e outras lojas.
Mikkelsen comanda duas usinas. A maior delas usa sensores computadorizados para separar os sacos de lixo codificados por cor.
A separação do lixo orgânico, incluindo os restos de comida, passou a permitir que Oslo produza biogás, o qual já abastece alguns ônibus no centro da cidade.
Outras áreas da Europa estão produzindo grande quantidade de lixo, incluindo o sul da Itália, onde lugares como Nápoles pagaram a cidades da Alemanha e da Holanda
para que aceitem seus resíduos, ajudando a neutralizar uma crise napolitana na coleta do lixo. No entanto, embora Oslo tenha cogitado receber o lixo italiano, a
cidade preferiu continuar com o inglês, considerado mais limpo e seguro. "É uma questão delicada", diz Mikkelsen.


** Estudo de assimetria ajuda tratamento de doenças
Por CARL ZIMMER

Um dia, em 1788, os estudantes da Escola de Medicina Hunterian, em Londres, estavam abrindo um cadáver quando descobriram algo surpreendente. A anatomia do morto
era uma imagem espelhada da que seria normal. Seu fígado ficava no lado esquerdo, em vez do direito. Seu coração tinha crescido no lado direito, não no esquerdo.
O relatório do professor da escola, o médico escocês Matthew Baillie, foi a primeira descrição detalhada dessa condição, que passou a ser conhecida como "situs inversus"
e parece ocorrer em cerca de uma em cada 20 mil pessoas.
Baillie afirmou que a condição poderia ajudar os médicos a compreender como nossos corpos normalmente distinguem o lado direito do esquerdo.
As mutações que causam o "situs inversus" podem levar a vários distúrbios graves, incluindo defeitos cardíacos congênitos. Decifrar os efeitos de genes alterados
poderia levar a diagnósticos e tratamentos dessas condições.
"Compreender como você monta esse eixo tem muitas implicações para a compreensão da doença cardíaca congênita", disse Rebecca Burdine, bióloga molecular na Universidade
Princeton, em Nova Jersey.
Dominic P. Norris, biólogo do desenvolvimento no Conselho de Pesquisa Médica em Harwell, na Inglaterra, e outros cientistas estão começando a resolver esse quebra-cabeça.
Eles identificaram alguns dos passos pelos quais os órgãos dos embriões se desenvolvem à direita ou à esquerda.
Nossos corpos começam simétricos, sendo o lado esquerdo um reflexo perfeito do direito.
A assimetria no corpo humano começa a aparecer depois de seis semanas de gestação. O coração é o primeiro órgão a se posicionar. Começando como um simples tubo,
ele se inclina para a esquerda e mais tarde gera diversas câmaras e vasos de cada lado.
Mas essas mudanças visíveis surgem muito depois de o embrião ter desenvolvido diferenças à esquerda e à direita. Experiências revelaram que o embrião inicial produz
proteínas diferentes de cada lado, embora ainda pareça simétrico.
Os biólogos identificaram o ponto exato em que essa simetria começa a se romper: um pequeno caroço chamado nódulo, na linha mediana do embrião. O interior do nódulo
é forrado por centenas de pequenos pelos, chamados cílios, que giram em um ritmo de dez vezes por segundo.
"É como um liquidificador", disse o doutor Norris. "Não para de girar."
Inclinados, os cílios empurram o fluido que envolve o embrião em uma direção, da direita para a esquerda. Quando os cientistas inverteram esse fluxo em embriões
de ratos, aconteceu a formação de órgãos invertidos.
Quando o fluido começa a se movimentar, leva apenas três ou quatro horas para que os lados esquerdo e direito sejam definidos. A borda do nódulo é cercada de cílios
que reagem ao fluxo sem girar. "Não sabemos os detalhes e a verdadeira mecânica do que acontece nessas células."
Os cílios podem então liberar átomos de cálcio que se espalham para as células circundantes. Estas reagem emitindo uma proteína chamada nodal, que se espalha pelo
lado esquerdo do embrião, deixando-o inundado de nodal.
"A nodal parece dizer diretamente às células do lado esquerdo para que se movam mais depressa que as da direita", disse a doutora Burdine.
As células rápidas do lado esquerdo puxam todo o coração no sentido horário. A partir desse giro inicial, o coração desenvolve seus lados esquerdo e direito diferenciados.
Alguns estudos sugerem que esses primeiros sinais também influenciam o desenvolvimento cerebral.
Os cientistas sabem, há muito tempo, que os dois lados do cérebro humano têm algumas diferenças importantes. O hemisfério direito, por exemplo, tem uma grande função
na compreensão da vida mental das outras pessoas, já o hemisfério esquerdo é importante para focalizar a atenção.
Enquanto observam esses sinais biológicos, os cientistas também estudam distúrbios que podem estar ligados à sua desordem.
"Situs inversus", a inversão total dos órgãos que Baillie descreveu em 1788, talvez seja o distúrbio mais drástico, mas também é um dos menos prejudiciais.
A inversão é relativamente segura porque todos os órgãos se alinham. O verdadeiro perigo está nas inversões incompletas -"quando fica uma confusão, e as coisas não
se ligam adequadamente", disse o doutor Norris.
Os casos mais preocupantes são os que afetam o coração. "Se o coração estiver no lugar errado, e todo o resto estiver certo, é quase sempre fatal", disse a doutora
Burdine.
Ela espera que a pesquisa sobre os distúrbios de esquerda e direita leve a testes genéticos capazes de prever o risco de defeitos cardíacos ocultos. Ela até vê uma
aplicação nas tentativas de reconstruir corações danificados com células-tronco.
"Vai ser mais que apenas fazer as células certas", disse ela, acrescentando que elas teriam de ser colocadas na estrutura tridimensional adequada e receber os sinais
corretos sobre aonde ir.
"E um desses sinais é o sinal de direita/esquerda", disse.


** DESCOBERTAS

- Modos à mesa
SINDYA N. BHANOO

O alossauro, um primo menor do Tyrannosaurus rex, foi um hábil caçador que atacava a presa como um falcão moderno, mostrando modos mais refinados à mesa que o T.
Rex.
"Enquanto o T. Rex era como um gorila furioso com uma picareta, o alossauro parecia um cirurgião com um bisturi", disse Eric Snively, engenheiro mecânico da Universidade
de Ohio e autor de um novo estudo sobre o dinossauro, baseado em ossos de 150 milhões de anos. Usando tomografia computadorizada e um método chamado dinâmica de
multicorpos, os pesquisadores modelaram os músculos do pescoço e da mandíbula do alossauro e simularam seus movimentos.
"O crânio é cheio de cicatrizes onde os músculos se prendiam, e pudemos reconstruir o dinossauro fazendo comparações com aves modernas", disse outro autor, Lawrence
M. Witmer, paleontologista na Universidade de Ohio.
Embora com mais de seis metros de comprimento e duas vezes mais pesado que um urso polar, o alossauro provavelmente mergulhava os dentes na presa. Como pequenos
falcões da América, ele mantinha a cabeça firme e então puxava a carne para cima. O T. Rex, em comparação, usava um movimento lateral, rasgando o alimento.

- Bebês e sacos plásticos
DONALD G.McNEIL JR.

Nos Estados Unidos, bebês muito prematuros são envoltos em plástico estéril para manter a temperatura do corpo, impedindo que ela baixe perigosamente.
Agora, um estudo com recém-nascidos em Zâmbia sugere que a técnica pode ser repetida com eficácia em países pobres usando simples sacos plásticos. "São sacolas plásticas
comuns, como as de supermercado", disse o autor do estudo, doutor Waldemar A. Carlo, especialista na Universidade de Alabama em Birmingham.
A pele dos bebês prematuros é muita fina, e a água evapora rapidamente através dela, às vezes levando a uma perda de calor que põe em risco a vida, especialmente
em um país pobre, onde a temperatura nas maternidades pode ser instável.
Em um hospital em Lusaka, em Zâmbia, os bebês eram colocados sobre o peito das mães logo após o nascimento, no típico "modo canguru", disse ele. Mas isso nem sempre
bastava para aquecê-los.
Colocar os bebês em sacos plásticos antes de enrolá-los em um cobertor era mais eficiente para manter o bebê aquecido quando eles eram levados para ser pesados ou
observados, ou quando a mãe estava dormindo ou passando por tratamento médico.

- Conexões artificiais
C. CLAIBORNE RAY

Para a substituição de articulações, como um joelho ou um quadril, o músculo é ligado ao implante artificial?
Comumente, "nenhum músculo se liga a um implante de joelho ou de quadril", disse o doutor Mathias P. Bostrom, do Hospital de Cirurgias Especiais, em Nova York. O
único tecido humano que adere a uma articulação implantada é osso.
A ligação é feita com cola ou diretamente com o osso. Quando a conexão é direta, as células que produzem osso geram novo material que forma uma ligação com o implante.
"Muitos implantes de joelho usam uma espécie de cola, na verdade, um cimento, que se fixa ao próprio osso", disse o doutor Bostrom. "É um acrílico semelhante a Plexiglas,
chamado PMMA, sigla de polimetil metracrilato."
No caso de uma prótese de um osso como o fêmur -em que muito osso é removido e grandes segmentos são substituídos por metal- pode haver alguma ligação de músculo
e tendão ao implante.
Na maioria dos implantes de juntas, porém, o músculo ainda está ligado ao osso por meio do tendão, e o cirurgião tenta especialmente evitar desligar qualquer inserção
muscular no quadril ou no joelho.
"Queremos que as ligações do tendão com o osso fiquem intactas", disse o doutor Bostrom.


** ENSAIO - JENNA WORTHAM
"Computação afetiva" mira emoções

A inteligência artificial cresce em nossas vidas em um ritmo constante. Dispositivos e aplicativos podem prever o que queremos, às vezes até antes de percebermos.
Então por que não poderiam compreender nossos sentimentos?
Se as reações emocionais fossem medidas, elas poderiam trazer dados valiosos para melhorar o design e o desenvolvimento de gadgets. Essa inteligência emocional artificial,
também chamada de computação afetiva, pode estar a caminho.
Mas isso deveria acontecer? Afinal, já lutamos para enfrentar a natureza onipresente dos dispositivos em nossas vidas.
Sim, esses gadgets seriam mais eficientes se pudessem reagir quando estamos frustrados, entediados ou ocupados demais para sermos interrompidos. Mas também seriam
intrusivos de maneiras que não podemos sequer imaginar.
Empresas como a Affectiva trabalham em softwares que treinam os computadores para reconhecer emoções humanas com base nas expressões faciais e reações fisiológicas.
Uma empresa chamada Beyond Verbal, que acaba de levantar cerca de US$ 3 milhões em capital de risco, está trabalhando em uma ferramenta de software que, com base
no tom da voz de uma pessoa, pode determinar qualidades como arrogância, incômodo ou ambas.
A Microsoft revelou recentemente o Xbox One, a próxima geração de seu console de jogos, que inclui uma atualização do Kinect, dispositivo de rastreamento de movimentos
que permite que as pessoas controlem jogos movendo mãos e corpo.
O novo Kinect, que chegará ao mercado no final deste ano, tem uma câmera de alta definição capaz de identificar pequenas mudanças do esqueleto e dos músculos do
corpo e da face.
Além disso, um dos novos sensores do Kinect usa tecnologia infravermelha para acompanhar os batimentos cardíacos do jogador. Isso poderia eventualmente permitir
que a empresa detectasse quando o pulso do jogador se acelera durante um concurso de condicionamento físico -e a sua animação ao vencer um jogo.
A Microsoft diz que os jogos poderão até se adaptar em tempo real à reação física dos jogadores, intensificando a ação se eles não estiverem suficientemente estimulados
ou reduzindo-a se ela estiver assustadora demais. "Estamos tentando entender a mente dos jogadores", disse Albert Penello, diretor de planejamento de produto da
Microsoft.
Com o tempo, disse ele, a tecnologia embutida na câmera do Kinect poderá ser usada para um leque mais amplo de aplicações, inclusive para rastrear as reações enquanto
uma pessoa vê publicidade ou faz compras on-line, na esperança de compreender o que atrai ou não o interesse da pessoa.
Empresas de mídia on-line, como Netflix, Spotify e Amazon, já têm acesso ao sentimento do consumidor em tempo real, sabendo de quais capítulos, trechos de canções,
filmes e programas de TV as pessoas gostam ou detestam, pulam ou querem assistir de novo.
Assim, não é um grande salto imaginar que sensores como os do Kinect serão usados para criar novas experiências de entretenimento.
As possibilidades vão muito além. Prerna Gupta, diretora de produto na Smule, estúdio de desenvolvimento que faz jogos para celular, falou sobre o assunto na conferência
South by Southwest, em Austin, no Texas, em março. Ela chamou sua palestra de "Apps do futuro: Instagram para cyborgs" e examinou o futuro distante das potenciais
aplicações. Para ela, indústrias como a de saúde poderão ser revolucionadas por tecnologias de percepção de emoções.
"Rastrear como nossos corpos reagem ao longo do dia poderá permitir que moldemos a vida de acordo com eles", disse. Poderia permitir que nutricionistas criassem
dietas minuciosas para clientes ou que médicos encontrassem tratamentos mais eficientes. É claro que o leque de preocupações éticas e de privacidade é enorme.
Clive Thompson, autor de um livro no prelo, "Smarter Than You Think: How Technology Is Changing Our Minds for the Better" [Mais inteligente do que você pensa: como
a tecnologia está mudando nossas mentes para melhor], diz que essas possibilidades animadoras precisam ser exploradas muito cuidadosamente.
Ele explicou que uma companhia de seguros, por exemplo, pode querer saber o estado de espírito de seus clientes de modo a aumentar seus prêmios se eles derem sinais
de estar deprimidos ou doentes. Ele se pergunta se todos nós ficaremos mais hábeis em mascarar as emoções se soubermos que estamos sendo observados e analisados.
"Estamos falando de enormes arquivos de dados pessoais que são realmente reveladores", disse Thompson.
"Sem mencionar que é perturbador que o reconhecimento da emoção se torne mais uma parte de nossas vidas que é arquivada e analisada."


** ENSAIO - DENNIS OVERBYE
A época do ano em que o Mundo acaba

O verão de Hollywood chegou, assim como o fim do Mundo. De novo.
Os cinéfilos são atraídos para filmes apocalípticos há décadas, ou pelo menos desde 1951, quando, em "O Dia em que a Terra Parou", Patricia Neal tinha de dizer as
palavras imortais "Klaatu barada nikto" para impedir que um robô alienígena destruísse o Mundo e todos nós por causa de nossos modos beligerantes.
Em um dos lançamentos deste ano, "Oblivion", alienígenas explodiram a Lua e os humanos se mudaram para Titã, uma lua de Saturno. Sob a supervisão de uma assustadora
controladora da Nasa chamada Sally, Jack Harper, interpretado por Tom Cruise, cuida de máquinas deixadas para trás para produzir energia e projetá-la para um posto
avançado gigantesco no céu, parecido com a estrela da morte e conhecido como Tet.
Ao investigar o pouso forçado de uma misteriosa espaçonave contendo humanos na Terra desolada, ele é capturado por um assustador bando subterrâneo de rebeldes, liderados
por Morgan Freeman.
Em "Depois da Terra", Will Smith e seu filho Jaden caem na Terra considerada inóspita para humanos, mil anos depois de um cataclismo. Enquanto isso, tudo no planeta
evoluiu para matar humanos. O filho, Kitai, tem de viajar pelo planeta sozinho para conseguir um sinalizador de alarme.
É claro que esses filmes não são sobre o fim do Mundo. O apocalipse é apenas o palco onde seres humanos seguem seus destinos pessoais com a ajuda de efeitos especiais
e alguma suspensão da razão científica.
No fundo, "Depois da Terra" é apenas uma história de pai e filho sobre um jovem ousado que tem de aprender a confiar em seu pai e a controlar suas emoções se quiser
evitar ser morto por um alienígena que pode localizar humanos pelo cheiro de seu medo. "O perigo é real", diz o slogan no cartaz. "O medo é uma opção."
"Oblivion" se passa em 2077, 60 anos depois que alienígenas invadiram a Terra e tiveram de ser combatidos com armas nucleares, deixando o planeta inabitável. Cruise,
cuja memória foi apagada (como precaução de segurança, dizem-lhe), tem de aprender a confiar em Freeman -o que você sempre deve fazer, é claro- e descobrir por que
a mulher que acaba de cair na Terra é a mesma que vem aparecendo em seus sonhos do edifício Empire State.
Não vai estragar o suspense dizer que, com a tutelagem de Freeman, nosso herói vai descobrir que tudo o que ele sabia sobre si mesmo e a história recente está errado.
"Depois da Terra" foi sonhado por Will e Jaden Smith como uma maneira de trabalharem juntos. No caminho, eles criaram uma história de fundo de 300 páginas que descreve
como os seres humanos arruinaram o planeta e afinal foram obrigados a deixá-lo por causa do ar poluído, do clima severo, dos tsunamis e dos terremotos.
Você poderia se perguntar, como fiz, o que os humanos têm a ver com tsunamis e terremotos. Quando perguntei ao diretor, M. Night Shyamalan, sobre isso, ele disse
que tinha a ver com "uma alma" por trás de tudo. "Gaia está nos rejeitando."
Curiosamente, a Terra mil anos depois parece tanto um jardim do Éden quanto um inferno, com árvores gigantescas, cachoeiras vertiginosas e uma vida silvestre prodigiosa
que mata e devora alegremente na habitual maneira darwiniana. É só o medo humano que tornou o lugar perigoso, disse Shyamalan.
Assim, a Terra suporta. Mas o Mundo não. O Mundo, para parafrasear a poeta Muriel Rukeyser, é feito de histórias, não de átomos -nem de vetores de doença ou de relações
entre predadores e presas. Assim, ele está sempre acabando e renascendo. Cada morte é o fim de um Mundo e cada divórcio o colapso de uma cosmologia.


** Gastronomia ganha nicho cinematográfico independente
Por ROBERT ITO

LOS ANGELES - As cineastas Natasha Subramaniam e Alisa Lapidus passaram quatro horas construindo uma sobremesa em quatro camadas feita de chantilly, cookies de amaretto,
suspiro e flores comestíveis. "É um misto de pavlova e 'croquembouche'", explicou Subramaniam.
Enquanto Lapidus posicionava rodelas de suspiro do tamanho de pires sobre a sobremesa mais e mais alta, Subramaniam fazia fotos de cada camada. As fotos seriam editadas
juntas, formando uma sequência em "stop-motion".
Então, inesperadamente, a montanha começou a ruir, com a camada inferior de chantilly cedendo sob o peso das rodelas de suspiro e dos cookies.
Se a filmagem fosse comercial, a sobremesa provavelmente teria sido descartada, e uma nova teria que ser preparada. Mas as duas diretoras formadas pelo California
Institute of the Arts não estavam fazendo um comercial -estavam rodando um filme, "Bloem", sobre a vida, a morte e o consumo dessa sobremesa por comensais que não
chegam a ser vistos. Em outras palavras, é um filme de arte. Logo, um pouco de chantilly fora do lugar não é problema.
Onde pode ser exibido um filme sobre a vida e a morte de uma sobremesa enorme? Em um entre os muitos festivais e eventos de cinema espalhados pelos EUA dedicados
a tudo o que existe de mais divertido e delicioso na comida (e que se danem as calorias).
Não são filmes que mostram como a comida que você consome pode matá-lo (como faz o documentário "Forks Over Knives"), contaminar o ambiente ("Food, Inc.") ou, ainda,
fazer você se sentir péssimo ("Super Size Me").
Ao contrário, são pequenas odes cinematográficas à comida, com títulos como "Sushi, Handcrafted Happiness" e "Bark Butter: Why Every Hot Dog Needs a Little More
Pork Fat".
"Não exibimos filmes com uma mensagem, nem nos envolvemos na polêmica da bronca", explicou George Motz, diretor de eventos do Festival de Charleston (Carolina do
Sul) de Cinema Gastronômico. "O que fazemos é celebrar a comida e quem a prepara. Passamos por cima das partes negativas."
O festival é descendente direto dos festivais de cinema gastronômico de Nova York (que está em seu sétimo ano) e de Chicago, este promovido desde 2010. Os três são
comandados por Motz.
Ao longo dos anos, festivais e eventos únicos semelhantes vêm surgindo em vários pontos dos Estados Unidos. Entre os filmes que estão no circuito dos festivais agora,
há dois documentários. O primeiro, "Ramen Dreams", é sobre um louco por miojo em Los Angeles que abre um restaurante de macarrão japonês em Tóquio. O segundo, "Mr.
Okra", trata de um morador de Nova Orleans que vende frutas e verduras em sua picape.
Um curta de 98 segundos, sem narrativa, foca a criação de um sonho de laranja e pistache.
Intitulado "The Benevolent Baker: Doughnuts", com direção de Scott Pitts, fotógrafo culinário comercial, o curta capta closes maravilhosos de um chef peneirando
farinha, ralando uma laranja e abrindo rodelas de massa.
Em outro filme de Pitt, "The Benevolent Butcher: Bacon", uma fatia de bacon é enrolada em volta de um filé de lombo, depois colocado numa frigideira para fritar
em azeite e em seu próprio sumo gorduroso.
Como Pitts avalia o sucesso de um filme? "Se você assiste ao filme e pensa 'estou com muita vontade de comer um filé enrolado em bacon', então o filme funcionou",
responde o diretor. Mas outra diretora, Liza de Guia, sempre se interessou mais pelas pessoas que fazem a comida. Depois de trabalhar em vários empregos locais de
televisão em Nova York, Guia sonhou em criar um seriado na Web sobre produtores e vendedores de comida que fossem pouco conhecidos.
A partir de 2008 ela propôs a ideia a "praticamente todos os blogs de comida da cidade" -e foi rejeitada por todos.
"Então tive uma ideia inteligente", prosseguiu. "Pensei 'por que estou esperando para receber permissão para fazer algo que quero fazer?'."
Em 2009, ela filmou um vídeo de três minutos sobre pessoas que plantavam hortas em telhados do Brooklyn e o postou no YouTube, onde ele rapidamente virou viral.
Em seguida, Guia fez vídeos sobre apicultores urbanos, criação de patos em pequena escala e sorvete sustentável, postando-os em seu próprio site recém-criado, o
Food Curated.
Seis meses mais tarde, ela foi indicada para o prêmio James Beard de melhor vídeo-webcast.
Em 2012, após várias outras indicações ao Beard, ela foi escolhida como cineasta do ano no Festival de Nova York de Filmes Gastronômicos.


**Restaurantes investem no uso de grelhas
Por RACHEL WHARTON

Quando Matthew Semmelhack e Mark Liberman, proprietários do AQ, em San Francisco, abrirem seu novo restaurante, neste ano, eles não terão fogão nem forno.
Em vez disso, a cozinha do TBD, como será chamado o novo restaurante, será dominada por um grill de aço inoxidável de 2,5 metros de largura, alimentado por lenha
e equipado com nichos feitos sob medida, compartimentos para a produção de carvão e quatro superfícies independentes de preparo de alimentos que Liberman, o chef,
poderá erguer ou abaixar facilmente com rodas movidas manualmente.
Quase tudo o que ele preparar -de frangos assados no espeto a endívias com glacê de laranja e açúcar queimado- será feito neste único equipamento, eliminando a relativa
previsibilidade dos aparelhos que fornecem calor constante. "Algumas pessoas dizem que isso limita nossas possibilidades de ação", comentou Semmelhack. "Mas nós
achamos que nos liberta."
Esqueça as churrasqueiras e os fornos ladrilhados para pizza que andam aparecendo em todo lugar -as grelhas a lenha estão prestes a se tornar a nova tendência. Mais
e mais chefs as estão usando para elevar a culinária a lenha para novos patamares, criando comida que está a anos-luz do churrasco.
Alguns, como Seamus Mullen, do Tertulia, no West Village de Nova York, chegam a dizer que as grelhas se tornaram parte essencial de seu trabalho. Diferentemente
dos grills tradicionais, em que uma grade é colocada sobre o fogo, essas versões são projetadas para proporcionar ao chef muito mais controle sobre o que acontece
com a comida.
Algumas grelhas são fechadas em três lados e revestidas de tijolos ou ladrilhos que conservam o calor. Além de simplificar o processo de grelhar, é possível assar
alimentos usando o calor emanado das paredes, tostar sobre o fogo abaixo ou defumar, ao alto.
O custo de instalação de uma grelha desse tipo é comparável ao de um equipamento convencional. Semmelhack comentou que a opção pela grelha vai poupá-lo do custo
de estender uma tubulação de gás até a cozinha do TBD, o que custaria caro.
Ben Eisendrath é proprietário da Grillworks, fabricante americana das grelhas de aço inoxidável produzidas à mão e que viraram favoritas de muitos chefs. Ele diz
que as grelhas são o segmento de seus negócios que mais vem crescendo.
Os chefs que passaram a preparar muitos de seus pratos na grelha não estão exatamente descobrindo uma novidade, mas explorando algo secular.
Afinal, preparar alimentos em fogo a lenha é o que há de mais antigo. Espanhóis e sul-americanos vêm usando grelhas semelhantes, embora mais rústicas, há séculos.
Os chefs conseguem incorporar a fumaça a seus alimentos, usando de sutileza e fazendo sua culinária parecer nova. Eles exploram constantemente novas utilizações
da grelha.
O chef espanhol Victor Arguinzoniz vem sendo tremendamente influente nessa área, atraindo visitantes de todo o mundo para seu restaurante Asador Etxebarri, no País
Basco espanhol. Ali, tudo (desde o caviar até o sorvete de leite de cabra defumado) ou é assado diretamente na grelha ou traz evidências do efeito de fumaça ou chamas.
No Blue Hill at Stone Barns, em Pocantico Hills, Estado de Nova York, Dan Barber usa sua grelha de 3,5 metros de altura, feita sob medida e instalada no pátio, para
intensificar sabores ou aplicar calor de maneiras que não poderia em uma cozinha tradicional.
No restaurante Reynard, no Brooklyn, o cardápio de Sean Rembold é infundido com o aroma de carvalho e macieira, a começar pelo pão torrado sobre a grelha a lenha
que é servido no café da manhã.
Rembold espera que sua grelha o ajude a atrair os melhores talentos -profissionais qualificados e interessados em aperfeiçoar sua técnica no calor de 219 graus Celsius.
Mas admitiu que isso pode acarretar problemas específicos no local de trabalho.
Qualquer pessoa que trabalhe no Reynard, explicou, precisa estar disposta a "assar lentamente ao longo de um turno de 12 horas".


** Cabeças animais viram prato da moda na China
Por CRAIG S. SMITH

PEQUIM - Bem agasalhadas num dia de ventania, 30 pessoas faziam fila diante da porta de um restaurante, esperando ficarem prontas suas cabeças de coelho.
Para os comensais no interior do restaurante, um vídeo demonstrava como consumir as cabeças, que têm o tamanho de um punho fechado. A demonstração ficava a cargo
de Su Yong, chef do restaurante e astro principal do vídeo. Ele abria a boca do coelho e separava o maxilar do crânio. Em seguida, quebrava o maxilar em duas partes
e chupava a carne. Caso ainda tivesse restado algum mal-entendido, cada mesa trazia um folheto com diagramas.
Poucas coisas deixam tão claras as diferenças entre as culturas do que a alimentação das pessoas. Rãs, na França, estômagos recheados de vísceras e aveia, na Escócia,
e pés de porco, na Alemanha.
O consumo de pênis de gatos, ratos e burros na China, por exemplo, pode não agradar ao paladar americano -e até mesmo a alguns paladares chineses. Escorpiões e cães
voltaram a ser comidos no país após a longa seca gastronômica dos anos de Mao Tse-tung. As cabeças de animais são o prato mais recente a recuperar popularidade.
Não se trata de uma novidade culinária -na realidade, é um prato local muito apreciado e cujas origens culturais vêm de longe.
Graças ao boom econômico que já dura uma década na China, os jovens chineses, cada vez mais cosmopolitas, vêm se afastando de suas raízes gastronômicas. Mas esse
mesmo boom levou a um revival, com chefs redescobrindo pratos que não eram vistos há décadas.
Cabeças de porco, de cabra e até mesmo de cachorro são comidas na China, mas o triunvirato reinante no país é formado pelo peixe, o pato e o coelho. Cada um destes
tem restaurantes dedicados ao seu preparo.
As cabeças de peixe têm aceitação mais ampla e são consumidas há mais tempo. Os restaurantes as servem com temperos regionais que vão desde molhos à base de soja,
típicos do nordeste da China, até os condimentos apimentados, populares nas províncias de Hunan e Sichuan, passando pelos sabores mais leves de gengibre e chalota,
comuns na costa sul do país. Não se consomem cabeças de peixe magras e ossudas, só as grandes e carnudas.
É difícil comer uma cabeça de coelho sem fazer sujeira, tanto que aventais e luvas de plástico são dados a alguns comensais. Consta que a cabeça condimentada de
coelho teria sido popularizada nos anos 1990 por uma mulher chamada Chen, residente em Shuangliu, na periferia de Chengdu, a capital provincial de Sichuan.
Operária de fábrica, Chen teria aberto um pequeno restaurante para complementar sua renda e, um dia, teria incluído em sua sopa apimentada as cabeças de coelho que
seu filho gostava de comer. O resultado de sua improvisação é conhecido, desde então, como "cabeça de coelho da mãe velha".
O prato se tornou tão popular que Chen mudou o nome de seu restaurante para Cabeça de Coelho da Mãe Velha. Hoje o lugar é um dos mais famosos de Sichuan a servir
a especialidade.
Su, proprietário do restaurante Coelho Old Street, em Pequim, contou que aprendeu a preparar cabeça de coelho com Chen e que seu estabelecimento serve 3.000 cabeças
de coelho por dia.
Mas as cabeças de coelho são um prato de nicho, comparadas à popularidade das cabeças de pato, uma moda que se espalhou a partir da cidade de Wuhan. Os chefs do
Pang Xijing servem até 300 cabeças por dia.
A sra. Pang compra caixotes de cabeças congeladas em um mercado local. Seus chefs descongelam as cabeças sob água corrente por seis horas, para que os maus odores
desapareçam, e então os aferventam numa sopa condimentada. As cabeças são cortadas pelo comprimento e refogadas com ervas e condimentos. Uma travessa com sete cabeças
de pato custa 62 yuans - cerca de US$ 10.
As cabeças de peixe não têm sabor pronunciado, mas contêm muitos ossinhos. As cabeças de coelho vêm em dois sabores: apimentadíssimo e temperado com cinco condimentos.
A carne tem sabor de carne escura de frango. Os olhos, cérebro e língua são apreciados não tanto pelo sabor, mas pela textura.
As cabeças de pato talvez sejam o que mais agrada ao paladar ocidental. Devorar uma delas é como comer uma asa de galinha fortemente condimentada (exceto pelo bico
e pelo olho acusador).
Para os indecisos, o prato típico de Quzhou, uma cidade ao sul de Xangai, é "três cabeças e um pé": uma cabeça de coelho, uma de pato e uma de peixe servidas em
um prato com dois pés de ganso.


** Produtores de uísque cortejam judeus
Por ROBERT SIMONSON

Quando, no ano passado, os patrocinadores da WhiskyFest, em Nova York, mudaram o festival de degustação de terça para sexta e sábado, muitas pessoas que eram presença
regular no evento não puderam comparecer.
Foi proposta uma versão alternativa: um evento de uma noite apenas, realizado na véspera da WhiskyFest. Apesar do pouco tempo para divulgar o novo evento, cerca
de 250 pessoas compareceram ao local improvável indicado, em Manhattan: a Sinagoga Institucional West Side.
Os aficionados do uísque eram judeus que não puderam participar do evento maior pelo fato de respeitarem o sábado judaico.
Para não deixar dúvida quanto ao objetivo da degustação especial, a Jewish Whisky Company, que a promoveu, intitulou o evento Whisky Jewbilee ("judeubileu" do uísque).
Não é de hoje que o setor varejista reconhece os judeus como clientes valiosos. "Os homens judeus se mostram muito interessados na seleção de uísques para casamentos,
bar-mitzvás ou bat-mitzvás", declarou Jonathan Goldstein, da Park Avenue Liquor Shop, em Manhattan. "Com frequência, compram uma garrafa para presentear amigos ou
parentes."
Parte da atração é o fato de que a maioria dos uísques é naturalmente kosher. Já o vinho, graças a sua longa ligação com a tradição judaica, precisa obedecer a muitos
regulamentos para conquistar um "hechsher", símbolo da certificação kosher.
Mesmo assim, produtores escoceses como Glenrothes, Glenmorangie, Ardbeg, Bowmore e Auchentoshan vêm cortejando os consumidores judeus e obtendo certificação kosher
oficial para certos produtos.
Os produtores de bourbon têm menos razões para se preocupar, porque sua bebida precisa, pela lei, ser envelhecida em barris novos. Já o uso de antigos barris de
vinho na produção de uísque por algumas destilarias preocupa consumidores judeus.
A destilaria Buffalo Trace, do Kentucky, recentemente pediu ajuda ao Conselho Rabínico de Chicago para produzir mais de mil barris de três variedades de uísque,
todos com certificação kosher.
"Agora temos muitos uísques que sabemos serem kosher", alegrou-se o rabino Aaron Raskin, da congregação B'nai Avraham, no Brooklyn. Seu uísque preferido é o esfumado
Laphroaig, de malte único de Islay. "Isso intensifica nossa alegria e favorece o comparecimento de fiéis às sinagogas."
A extensão em que uma congregação adere ou não ao uísque pode variar. "Tudo depende do rabino em quem você confia", opinou o rabino Arian. Alguns se contentam com
os uísques que são kosher por natureza, outros preferem contar com a garantia extra do "hechsher". Para alguns consumidores, o envelhecimento do uísque em barris
de vinho desqualifica uma garrafa, outros não se preocupam com a distinção.
O Whisky Jewbilee será realizado novamente neste outono, num local maior. "Há algumas destilarias com as quais não entramos em contato no outono passado", disse
Jason Johnstone-Yellin, um dos fundadores da Jewish Whisky Company. "Eles pediram para participar. São pessoas inteligentes. Sabem quem não vai estar diante de suas
mesas nas noites de sexta e sábado."

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1 arquivo anexado:

Artigos de 18-6-13- Do New York Times para a Folha.txt

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